Royal Enfield: vale a pena ter uma na garagem?
Aceleramos os três modelos que serão vendidos no Brasil
De que ano é? Essa será uma pergunta recorrente que você terá que responder caso compre um dos três modelos que a Royal Enfield trouxe para o Brasil. Acostume-se, então, com a cara de espanto do curioso quando ele ouvir que a motocicleta é ano 2017.
VOCÊ JÁ OUVIU FALAR NA ROYAL ENFIELD?
A Royal Enfield é uma marca que nasceu em Redditch, na Inglaterra, em 1901 e é considerada a empresa de motociclismo mais antiga do mundo em produção contínua. Em 1955, a marca fez uma parceria com a indiana Madras Motors, originando a Enfield India para produzir - lá mesmo na Índia - 800 motos encomendadas pelo governo do país para sua frota militar.
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Desde que fábrica no Reino Unido encerrou as atividades, em 1971, a operação da marca e produção das motos Royal Enfield está nas mãos dos indianos. Atualmente, quem está no comando é a Eicher Motors. As motos são vendidas na Índia, Estados Unidos, Colômbia, Africa do Sul, Indonésia, Europa e, finalmente, chegaram ao Brasil. Por aqui, há uma subsidiária local, a Royal Enfield do Brasil, que é a segunda distribuição direta da empresa fora da Índia, a primeira opera nos Estados Unidos.
VOCÊ É UM CLIENTE ROYAL ENFIELD?
Qualquer pessoa que tenha no mínimo R$ 18.900 pode chegar na única concessionária do Brasil, que fica em São Paulo (SP), e adquirir a sua. As motos vêm importadas da Índia no sistema CBU (completely built-up). A marca, porém, quer fisgar aquele cara que tem um HB20, por exemplo, e vai semanalmente posar de hipster na barbearia da moda pagando 70 pratas para fazer a barba (nada contra, ok?) e melhorar o meio de transporte do sujeito colocando-o em cima de uma estilosa motocicleta Royal Enfield. Mesmo que este seja o primeiro contato dele (ou dela, não nos esqueçamos das moças) com uma motocicleta. Diz aí se não seria um belo upgrade no style?
QUAL ESCOLHER?
São três modelos disponíveis no Brasil, a Bullet 500, a Classic 500 e a Continental GT, e os preços vão de R$ 18.900 a R$ 24.500. Em comum, embora o estilo impressione, as motos têm construção, mecânica e acabamento simples. O pacote sem frescuras vem embrulhado pelo slogan absolutamente bem pensado para justificar a simplicidade: “nós acreditamos no motociclismo puro”. Pronto, temos um produto interessante no mercado. Mas como andam as Royal Enfield?
BULLET 500
Durante o teste de 140 quilômetros que fizemos com as motos pelo interior do estado de São Paulo, eu estava justamente pilotando o modelo de entrada, Bullet, quando parada no semáforo me perguntaram de que ano era a moto. Eu falei a verdade, ano 2017, mas se eu dissesse que ela havia sido fabricada em 1932, ele acreditaria. Digo isso, pois esse modelo nasceu em 1932 e continua em produção desde então com pouquíssimas alterações. Sim, é isso mesmo.
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Foi justamente ela que escolhi para começar. O estilo é street e qualquer “estranheza” notada no design é rapidamente deixada de lado ao lembrarmos que ela está rodando praticamente igualzinha há mais de 80 anos. Eu, observadora que sou, não tive como deixar de notar os pontos de ferrugem na porca de ajuste da coluna de direção do exemplar que pilotava. O painel é simples e parece meramente ilustrativo. Embora a luz do 'Neutro' quase não se veja e não exista conta-giros, o velocímetro funciona direitinho. Já o tanque, que pode ser preto, verde ou cinza, recebeu mais cuidados no acabamento, há até uma linha dourada pintada à mão.
Gostei da posição de pilotagem, mas achei que o banco poderia ser um pouco mais confortável. Acordei o motor pela partida elétrica, já que minhas tentativas de partida no pedal – ela também tem essa opção – não foram bem sucedidas (reforçarei o treino da perna direita na academia). Com os primeiros quilômetros rodados, veio aquela “cócega” nas mãos e pés, característica da vibração do motor transferida aos manetes e pedais. Minutos depois, as mãos amorteceram, péssima sensação pra quem precisa justamente das mãos para controlar a aceleração da moto. Mas calma, nem tudo está perdido. Mais familiarizada com a Bullet, saquei que o “segredo” era rodar com marchas altas e curtir o “tó tó tó” ritmado do monocilíndrico. Aí sim, o passeio fica bom.
A Bullet utiliza um monocilíndrico 4 tempos com injeção eletrônica, porém refrigerado a ar, de 499 cm³. São 27,5 cv de potência máxima a 5.250 e torque de 4,2 kgf.m a 4.000 rpm. O câmbio é de 5 marchas e a transmissão final por corrente.
Não espere um desempenho arrebatador. O apetite da Bullet é modesto para os brasileiros, porém é mais que suficiente para o uso urbano e para encarar uma estradinha de vez em quanto, de leve. Em troca, ela te entrega ciclística de sobra, muita agilidade e um acerto de suspensão bem equilibrado que agradou muito. O garfo telescópico na dianteira e o sistema bichoque atrás tem calibração suave e progressiva. As rodas são raiadas - aro 19 na dianteira e 18 na traseira – e há freio a disco na dianteira. Não há opção de ABS.
CONTINENTAL GT
Depois parti para a Continental GT, a mais cara das três, vai de R$ 23.000 até R$ 24.500 para a versão com freios ABS. O primeiro exemplar deste modelo foi lançado em 1965 e, segundo a Royal Enfield, era a 250cc mais rápida da Grã-Bretanha na época. A nova Continental GT utiliza um motor um pouco mais potente, de 535 cm³ e possui um projeto mais moderno, desenvolvido no centro técnico da marca na Inglaterra.
Ela é uma legítima cafe racer. Ao me posicionar na moto, me encaixo de uma maneira totalmente diferente da Bullet. As pedaleiras são bem recuadas, as costas ficam mais curvadas para que o piloto alcance os semiguidões e os joelhos encaixam-se nos recessos no tanque. Escolhi a verde, por ser a mais bonita na minha opinião e por estar equipada com espelhos muito mais estilosos que os convencionais. Segundo Claudio Giusti, diretor geral da marca no Brasil, eles estão estudando trazê-los como acessório – este é o modelo com mais potencial para agradar quem gosta de customização. Confesso que fosse minha, eu já saía da loja com os espelhos novos. Para arrematar o estilo, o banco possui uma cobertura na rabeta.
Faço uma ressalva quanto a solda da ponteira do escape do modelo, um serviço absolutamente grosseiro que destoa do resto da peça. Depois que vi o escape do exemplar que eu estava pilotando, fui examinar uma a uma. Alguns melhores, outros piores. A justificativa pode ser as alterações que o sistema de exaustão recebeu para poder atender ao Promot 4, programa de controle de emissões e ruídos, ou porque... enfim. Na verdade, acho que faltou um pouco de cuidado.
O motor monocilíndrico também é refrigerado a ar e gera 29,5 cv de potência máxima a 5.100 rpm e 4,49 kgf.m a 4.000 giros –, falando em rotações, o painel desta versão possui, além do velocímetro, conta-giros analógico e uma pequena tela digital. O câmbio também é de cinco marchas, mas a relação das primeiras marchas é bem alongada. Para terem uma ideia, em um rolê na cidade em baixa velocidade, uma primeirinha é suficiente, em segunda marcha ela reclama.
Comparada à irmã de entrada, a vibração é muito menor, mas o ganho de potência é pequeno. O upgrade em desempenho não chega a ser tão perceptível, ao contrário dos freios e suspensões. Esses sim, entregam muito mais do que a moto exige. A Continental GT tem freios a disco em ambas as rodas, na dianteira mordido por pinças da marca Brembo.
A suspensão utiliza garfo telescópico na dianteira e dois amortecedores da marca Paioli atrás. Dei sorte de estar com o modelo no trecho mais sinuoso entre as cidades de Serra Negra e Morungaba – trecho muito conhecido por motociclistas de várias gerações. Confesso que me diverti muito nas curvas e, neste modelo, pude contar com o grip extra dos pneus Pirelli Sport Demon calçados em rodas aro 18.
CLASSIC 500
Por fim, a Classic 500. Das três, o modelo de preço intermediário – de R$ 19.900 a R$ 22.900 - seria minha escolha se eu fosse colocar uma delas na minha garagem. A Classic é oferecida em uma infinidade de cores, com e sem ABS. Veja aqui.
Quis pilotar a verde militar (Battle Green) para garantir a foto acima. Ela se diferencia das demais por ter rodas também pintadas na cor da moto. Quadro, motor, painel, suspensões e freios são os mesmos da Bullet, mas a Classic é muito estilosa, com design que remete às motos da Segunda Guerra Mundial e, na cor que escolhi, pintura fosca.
Ela é a mais confortável das três e surpreendeu neste quesito. Vem equipada com um banco único com mola, mas também será oferecida com o assento do garupa. Uma peça oval na lateral esconde um porta ferramentas e as laterais do tanque contam com pads emborrachados. As rodas são aro 19 na dianteira e aro 18 na traseira.
Curti muito pilotar a Classic 500: pela posição de pilotagem, pelo torque que está presente desde baixas rotações, pelo estilão. E não é que tudo isso combinado entrega mesmo a tal sensação do motociclismo puro?
Mas ela não vibra? Vibra sim e isso faz parte. Aliás, amigo, o tal moto purismo de verdade vem junto de vibrações, vazamentos de óleo e quebras. Quem tem moto antiga sabe do que estou falando. Com uma “antiga” ano 2017 você sai no lucro.
VALE A PENA?
Sinceramente, achei as indianas da Royal Enfield mais honestas que as chinesas vendidas por aí, além disso, se você procura um modelo estiloso para rolês tranquilos, não há opções zero km na faixa de R$ 20 mil, apenas usadas. Das clássicas modernas, a Triumph oferece a Street Twin a partir de R$ 36.500. A Ducati, não cobra menos de R$ 38.900 pela Scrambler, enquanto uma Harley-Davidson não sai por menos de R$ 39.500, preço do modelo de entrada Sportster 883. Outro fator favorável é que a Royal Enfield não é - e nã minha opinião não será - alvo dos bandidos. Trocando em miúdos, isso quer dizer que você poderá passear tranquilamente sem achar que será roubado a cada esquina.
Claudio Giusti, diretor geral da marca no Brasil, garantiu que a marca terá peças de reposição a preços justos – que serão anunciados em breve - e um bom pós venda. Agora, é o tempo que vai nos dizer se as motocicletas são mesmo robustas.
Pelo uso displicente que os indianos fazem dela (os caras não aceleram, mas rodam sem dó, em estradas terríveis) as motos da Royal Enfield prometem não desmanchar a qualquer buraco. E outra, não podemos nos esquecer que a empresa começou produzindo peças para armas. Aliás, eles reforçam isso o tempo todo com a frase estampada no logo: made like a gun (feito como uma arma, traduzido do inglês).