A sigla em inglês SDV, que significa "Veículo Definido por Software" (programa de computador), está cada vez mais presente - mas até certo ainda é um ponto misterioso para alguém que não faz parte do mundo fechado dos especialistas no tema.
O conceito foi inicialmente introduzido pela Tesla, para depois ser copiado por chineses e adotado por grandes produtores mundiais de veículos. Resta saber como e quando o comprador de automóveis aceitará as mudanças, e se estará disposto a pagar por isso.
Duas experiências negativas já foram relatadas e citadas adiante. Segundo o TechCrunch, jornal on-line com foco em tecnologia, o SDV deverá revolucionar desde a arquitetura do veículo até a produção dos carros. Também exigirá grandes mudanças nas cadeias de
suprimento e no modo de definição dos projetos em um futuro próximo.
Mike Ramsey, analista automotivo do Gartner Data, explicou ao site americano: "Um veículo
definido por software poderá receber atualizações ao longo do tempo, sem precisar trocar
componentes mecânicos e eletrônicos".
Outro especialista, Moritz Neukirchner, da empresa de software Elektrobit, admitiu que este é um conceito em moda. "É bom frisar, porém, que não se trata de simples modernização e sim de algo que deverá incorporar novo valor ao veículo em qualquer fase de sua vida útil".
Segundo ele, a metáfora de "smartphones sobre rodas" até parece adequada, mas não pode ser levada a sério pois telefones se tornam superados ou até obsoletos. Já os fabricantes de veículos precisarão fazer com que, por meio de SDV, seus produtos possam ser modernizados constantemente ao longo do tempo, apesar do natural desgaste do produto.
Para Stefan Buerkle, líder de projetos por computação da Bosch, um automóvel bem equipado tem atualmente cerca de 100 unidades de controle eletrônico (ECU, em inglês) diferentes, cada uma com uma finalidade específica - como assistência à direção, ativação de airbags, travamento das portas, etc.
Já a arquitetura eletrônica em um veículo definido por software deverá ser bem diversa, segundo ele: "É quase impossível gerenciar 100 ECUs e garantir que, quando se atualiza uma delas, continue a se comunicar corretamente com outra não atualizada. Um SDV precisa de uma arquitetura de informação simplificada para reunir todas as funções em uma ou duas ECUs no máximo".
Atualmente, o sistema que mais se aproxima do termo SDV é praticado pela Tesla. Pode
adicionar novos recursos por meio de atualizações de software "over-the-air" (remotamente), de jogos a sistema de detecção de buracos, além de também emitir atualizações que alteram o desempenho do carro ou até mesmo o gerenciamento da bateria.
Contudo, a Tesla não fornece o software para todos os seus modelos, nem tem ainda uma loja de aplicativos para seus automóveis, embora parece estar se preparando para isso.
Enquanto isso, a Mercedes-Benz e a empresa de tecnologia da informação Nvidia estão
desenvolvendo uma arquitetura definida por software para a próxima geração de modelos da
marca alemã. Um importante recurso será a capacidade de adquirir e adicionar aplicativos e serviços de assinatura por meio de atualizações do software remotamente durante toda a vida útil do carro.
Claro que as atualizações terão custos para o consumidor e deverão ser uma maneira dos
fabricantes recuperarem o que estão investindo em SDV. Mas, curiosamente, as primeiras
experiências de instituir taxas de assinatura fracassaram. A BMW tentou cobrar de modo remoto pelo aquecimento dos bancos em um dos seus modelos, mas recuou em razão de reclamações. Também não deu certo a assinatura do sistema de automação de direção lançado pela Ford nos EUA.
Para a engenheira marroquina Zineb Ammor, da Lear Corporation, uma das principais
fornecedoras para fabricantes de automóveis, o SDV está sujeito a alegrias e também a percalços.
Segundo ela, o bom é melhorar o consumo de combustível e elevar a experiência de condução a níveis sem precedentes. "É como ter uma equipe de gênios em tecnologia na retaguarda constantemente ajustando o veículo. Podem até detectar possíveis problemas técnicos antes de se tornarem uma dor de cabeça".
O mau fica por conta de possíveis bugs e a necessidade de atualizações recorrentes. "Como acontece com qualquer avanço tecnológico, os veículos não estão imunes aos bugs ou falhas ocasionais. Exigem correções imediatas, obrigando os engenheiros a se debruçarem num labirinto de códigos. Estes reparos e sua manutenção também poderão ser dispendiosos", acrescenta a engenheira.
As preocupações com a segurança cibernética são o lado feio. A conectividade abre a porta para potenciais ameaças de ataques de hackers, pois os SDVs dependem de redes e sistemas de comunicação que podem ser vulneráveis às tentativas criminosas. Ammor enfatiza que "proteger os dados do cliente e garantir a integridade dos sistemas no veículo também serão desafios cruciais para os fabricantes".