Sabe aqueles filmes clássicos de western em que um forasteiro desconhecido chega bicando a porta do saloon, faz a banda parar de tocar e intimida xerife, prefeito, barman e até os canalhas que jogam cartas ostentando um cigarro no canto da boca? Pois é, o novo Chevrolet Cruze 2017 desembarca desta mesma forma em solo brasileiro, ‘armado até os dentes’ para impor respeito no ‘violento’ segmento dos sedans médios.
Trata-se de um carro completamente novo. Esqueça a primeira geração do modelo, sucesso de vendas no mundo – não por aqui – com mais de 4 milhões de unidades entre 2008 e 2016. Por fora, o jeitão clássico e discreto deu espaço para a esportividade e o arrojo. Perdeu completamente as influencias norte-americanas para assumir uma postura claramente asiática. Resumindo: parece um típico sul-coreano – se falassem que é um projeto Hyundai ou Kia, eu acreditaria. Tem elementos que remetem ao Hyundai Elantra, ao Kia Cerato e até mesmo o Hyundai HB20 S.
Porém, mais que mera estética, a segunda geração do Cruze é, mecanicamente, muito melhor. Em absolutamente todos os sentidos. Sai o insosso motor 1.8 16V Flex aspirado de até 144 cv de potência e 18,9 kgf.m de torque e chega o moderno 1.4 16V Turbo Ecotec bicombustível (injeção direta e comando variável de válvula) de 153 cv e 24,5 kgf.m, quando abastecido com etanol.
A transmissão é a mesma de 6 marchas, mas com melhorias em calibração e software para atender ao comportamento mais intenso do propulsor. Agradeço à engenharia da Chevrolet não ter pensado em um câmbio CVT, já que a proposta deste ‘forasteiro’ produzido na Argentina é entregar, além do conforto, esportividade e prazer ao volante. E entrega...
Durante o test drive, parti da Zona Sul de São Paulo até a pista de provas da marca norte-americana em Indaiatuba, interior do estado. Os primeiros quilômetros na Marginal Pinheiros já foram suficientes para me convencer que a nova geração é superior à anterior. As acelerações e especialmente as retomadas são muito mais intensas, apesar de a transmissão ter um rápido momento de ‘reflexão’ antes de decidir qual melhor marcha. Nada que incomode ou prejudique a performance.
É possível fazer as mudanças por meio da alavanca com toques para cima e para baixo – felizmente nada de ‘botãozinho’ na manopla. No caso do Cruze, aletas atrás do volante seriam interessantes pela proposta de desempenho. E este equipamento não está disponível nem como acessório.
Apesar de a força máxima estar disponível a partir de 2.000 rpm, 90% do torque já aparece a 1.500 giros, evitando que em baixas rotações o Cruze fique chocho. O turbo funciona com pressão média de 0,96 bar. Resultado deste vigor é uma aceleração de 0 a 100 km/h em 9 segundos – geração anterior fazia em 9,8 segundos e o Vectra com motor 2.4, em 10,5 segundos.
E atrelado a esta performance está eficiência. De acordo com a fabricante, os índices de consumo ficaram em 7,6 km/l na cidade e 11,2 km/l na estrada, quando com álcool no tanque. Com gasolina, os números foram de 9,6 km/l (cidade) e 14 km/l (estrada). Além do motor ser menos beberrão por natureza – um dos benefícios do chamado downsize -, as rodas de liga leve de 17 polegadas utilizam pneus de baixa resistência a rodagem (chamados pneus verdes), o coeficiente aerodinâmico melhorou e o sistema start-stop (desliga e liga o motor automaticamente ao parar em um semáforo e arrancar, por exemplo) é item de série. O novo Cruze é até 30% mais econômico que o anterior. Muita coisa...
A suspensão está bem equilibrada – dianteira é independente tipo McPherson com barra estabilizadora, e a traseira adota eixo de torção, semi-independente. Firme, no entanto, mais soft que o Cruze anterior. Confesso que esperava um comportamento rígido acentuado. Não há final de curso dos amortecedores e chama a atenção o silêncio do sistema. O comportamento do Chevrolet, mesmo em uma tocada mais apimentada – como pude aproveitar em uma das pistas do campo de provas -, é absolutamente previsível. Não há saídas de traseira e a dianteira escorrega de maneira sutil. O Cruze é previsível, o que é excelente pensando em segurança. Os controles de atração estabilidade estão lá, mas não são intrusos e, quanto atuam, não são abruptos, permitindo que a pilotagem ganhe sabor.
Por dentro...
O Cruze está maior 6 centímetros, agora com 4,66 metros de comprimento. A distância entre os eixos, no entanto, aumentou apenas 1 centímetro, chegando a 2,70 metros. Entretanto, com a nova disposição dos bancos e inclinação do encosto do assento traseiro, o espaço para as pernas e joelhos para quem vai de passageiro é muito bom. Apenas a queda mais acentuada do teto pode incomodar a cabeça dos mais altos. O porta-malas acabou prejudicado, passando a transportar 440 litros - 10 litros a menos que a primeira geração. Mesmo assim continua sendo excelente para toda a família.
O acabamento me decepcionou um pouco, mesmo na opção LTZ + (a mais completa). Algumas peças não estavam bem encaixadas, especialmente no console central. Os bancos e painéis das portas são revestidos em couro, o que é bom. O problema é a coloração clara, que não agradou muito - mas isso é um gosto pessoal. O plástico na parte superior das portas também poderia ser emborrachado, afinal estamos falando de um veículo de R$ 107.450. Os cromados, em contrapartida, estão bem distribuídos e sem abusos.
O assento do motorista (apenas) tem regulagens eletrônicas, enquanto a coluna de direção traz ajustes manuais de altura e profundidade. Muito fácil encontrar uma boa posição ao volante, que é, diga-se de passagem, multifuncional e tem boa empunhadura. O interessante é que alguns comandos, como do sistema de som, estão atrás – onde normalmente estão as aletas do Paddle Shift -, ao melhor estilo Chrysler. Pelo volante também é possível comandar as funções do computador de bordo, que traz, além das leituras tradicionais como consumo, autonomia e temperatura, como também tendência de consumo, tensão da bateria, pressão dos pneus e até vida útil do óleo do motor.
Ainda por meio do volante é possível acionar, apenas nesta configuração topo de linha, o alerta de colisão frontal, que tem três níveis (distâncias) em relação ao veículo à frente, e o alerta de saída de faixa. Este, aliás, atua diretamente. Caso os sensores detectem que o veículo está saindo da faixa de rodagem, o volante atua levemente para corrigir a trajetória e emite para o motorista um sinal no painel de instrumentos. É interessante, traz certa segurança, mas as vezes incomoda. O Chevrolet também tem um terceiro alerta, que é o de objeto no ponto cego.
A direção tem assistência elétrica progressiva, excelente para manobras – apesar de o Cruze topo de linha contar com assistente de estacionamento (aquele que detecta a vaga e que por meio de instruções que aparecem no painel orienta o motorista a engatar marcha ‘Ré’, acelerar e pisar no freio, enquanto o volante gira automaticamente para encaixar o carro na vaga). Há câmera de ré e sensores de estacionamento dianteiro e traseiro. O ar-condicionado é eletrônico, mas de apenas uma zona e não oferece saída para aqueles que viajam no banco de trás.
A central multimídia é o MyLink II com tela de 8 polegadas sensível ao toque. Entre as novas funções está o GPS 3D. E o melhor é que agora é compatível com Apple CarPlay e Android Auto. O OnStar – serviço de concièrge – também está à disposição, assim como carregador Wireless para smartphone, controlador e limitador de velocidade, farol alto adaptativo, airbags frontais, laterais e de cortina, além de freios com ABS (antitravamento) e EBD (distribuição eletrônica de frenagem).
Conclusão
Em comparação à geração anterior, o novo Cruze beira a excelência. Design atual com pegada esportiva, conjunto mecânico que entrega performance e eficiência, e bastante tecnologia pensando em conforto e segurança. Para quem gosta de dirigir, o Chevrolet também agrada muito. "Tem condições, hoje, de bater Toyota Corolla e Honda Civic?" Minha resposta é ‘sim’, caso sejam avaliadas apenas questões dinâmicas. Agora, se a dúvida é em relação às vendas, minha resposta é ‘não’. Não apostaria que o Cruze seja capaz de desbancar a dupla japonesa. No entanto, como em todo filme clássico de western, o forasteiro desconhecido, no caso o Cruze, sempre tem carta na manga. Vamos ver...
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