Entro no carro. Procuro pela famosa chave de ignição, que tradicionalmente fica localizada à esquerda do painel. Não acho. No lugar, está lá um impessoal botão de partida — igual ao do Taycan, diga-se. Tudo bem, vamos adiante.
Pressiono. Nada do barulho do 2.0 turbo ou da trilha sonora do V6. O despertar do quadro de instrumentos e do multimídia se misturam apenas ao silêncio da cabine. Bem-vindos ao novo Porsche Macan. Elétrico.
A estranheza é temporária. A posição perfeita de dirigir, o volante quase reto e com ótima ergonomia, e os bancos com muito apoio para o corpo dizem para a minha cabeça que ainda estou em um Porsche.
Assim que boto o SUV em movimento, tudo volta ao normal. Só que no mudo. Minto: o Macan EV até pode emular um som para o interior assim que você pressiona o acelerador com mais ênfase. É artificial, mas é uma tentativa de aproximação com o costume de outrora.
Antes de continuar, no entanto, preciso fazer uma confissão. Quando apareceu pela primeira vez, em janeiro deste ano, o Macan EV não me agradou esteticamente. Ao menos pelas fotos. "Acabaram com o carro", lembro de bradar à época, e reclamar principalmente da traseira.
Dez meses depois venho aqui me retratar. Ao vivo o SUV é bem agradável aos olhos, proporcional e esportivo, especialmente na versão mais cara, Turbo, que tem para-choques mais provocadores, entradas de ar e rodas mais agressivas.
Bom, estou dentro do Macan 4, segunda das quatro versões vendidas no Brasil. Custa R$ 560 mil, tem dois motores elétricos, fornece até 408 cv de potência, 66,3 kgf.m, cumpre o zero a 100 km/h em 5,2 segundos e vai até 220 km/h de velocidade máxima.
A tradução disso é uma baita aceleração e, claro, força a qualquer momento. Dá para grudar o corpo no banco em uma pisada mais forte. Pude rodar cerca de 100 quilômetros com o SUV de luxo e deu para notar que a direção é muito precisa, igual às de todos os Porsche. Fácil saber o que acontece nas rodas dianteiras e para onde elas estão indo.
Só que talvez o número que você esteja mais interessado é o da autonomia. Então lá vai: 443 quilômetros, segundo a homologação do Inmetro - que é bem rígida. Ou seja, na vida real, você pode conseguir rodar mais de 550 quilômetros com uma carga.
A distância original, por sua vez, bota o Macan EV no sexto lugar do ranking dos carros com maior autonomia, empatado com o Chevrolet Equinox EV.
A suspensão é outro ponto que preciso destacar. A Porsche trouxe a expertise de carros mais caros para o Macan. Além de ser pneumática, tem amortecedores com tecnologia de duas válvulas, vinda diretamente dos modelos Cayenne e Panamera. Ela consegue balancear a compressão e o rebote da peça para dar um equilíbrio excepcional ao SUV.
O Macan não é molenga. Tem um rodar sólido, firme, a carroceria rola pouco e tudo sem prejudicar o conforto para o dia a dia. Filtra bastante as saliências ou reentrâncias do asfalto.
A Porsche também oferta pela primeira vez no Macan o eixo traseiro esterçante, que movimenta as rodas traseiras em até cinco graus para dar mais estabilidade em altas velocidades ou um maior poder de contorno e de manobrar em baixas.
Tudo isso só é possível por causa da forma e do conteúdo. O design aerodinâmico garante um coeficiente de arrasto de 0,25, ótimo índice para um SUV. Isso se traduz em mais autonomia. A Porsche diz que se o Macan a combustão virasse elétrico, por exemplo, percorreria 85 quilômetros a menos que o EV.
O Macan EV ainda é produzido sobre a moderna Premium Platform Electric (PPE) com arquitetura de 800 Volts. Esta base foi desenvolvida com a Audi, que, assim como a Porsche, faz parte do Grupo Volkswagen.
No lado das argolas, o novíssimo Q6 e-tron também usa esta plataforma, que foi pensada desde a origem para carros elétricos. Em dimensões, o SUV tem 4,78 metros de comprimento e 2,89 m de entre-eixos. São 6 cm e 8,6 cm a mais que o antecessor, respectivamente.
Apesar do porte de médio, o Macan tem espaço de compacto. Atrás, apenas duas pessoas viajarão com certo conforto. O túnel central é bem alto e prejudica as pernas de um terceiro ocupantes. Já o porta-malas leva 540 litros atrás e 84 litros na frente, sob o capô.
O interior é caprichado e bem parecido com o do Taycan. Estão lá as telas de 12,6 polegadas do painel de instrumentos digital totalmente configurável e o multimídia com visor de 10,9 polegadas.
Opcionalmente a marca oferece uma terceira tela, também de 10,9 polegadas, para o passageiro controlar as funções do carro sem precisar mexer no monitor central. A Porsche ainda não eliminou todos os botões físicos no Macan EV. Viu, Volvo?
O SUV premium estreia no Brasil em quatro versões com preços entre R$ 560 mil e R$ 770 mil. A potência também varia: de 360 cv a 639 cv (com overboost). A bateria é sempre de 100 kWh, porém entrega diferentes autonomias dependendo da configuração - a mínima é de 435 quilômetros. O carregamento AC pode ser feito em até 11 kW e o DC suporta até 270 kW (com 800 Volts).
O Macan a combustão — de antiga geração — continua sendo vendido por aqui para complementar o portfólio e começa em R$ 490 mil. Até quando? Fica a pergunta.
A marca alemã ousa na nova e segunda geração do SUV premium, que não terá versões a combustão. Isso porque atualmente o Macan é o vice-campeão de vendas da Porsche ao redor do globo, com mais de 55 mil exemplares em 2024. O primeiro é outro SUV, o Cayenne.
Arriscado? Talvez sim. Em alguns mercados os carros movidos a bateria patinam e já fizeram alguns fabricantes tirarem o planejamento da tomada.
Não é o caso da marca alemã, mas a Porsche caminha firme para a eletrificação da linha 718. E já confirmou que a nova geração do Cayenne também será elétrica. Então fica a dica. Erro ou acerto? Só o tempo — e o mercado — irão dizer.